15/09/2010

Zé Maria visita o Piauí e concede entrevista ao sistema de comunicação O DIA.Veja:
"Serra, Dilma e Marina defendem a mesma coisa", diz Zé Maria

Foto: Jairo Moura/O DIA
O candidato à Presidência da República pelo PSTU, Zé Maria
O candidato à Presidência da República pelo PSTU, Zé Maria

Em visita ao Piauí, o candidato à Presidência da República pelo PSTU, Zé Maria, participou de debates, fez panfletagem, partiu para o corpo-a-corpo com o eleitorado, mas criticou a falta de democracia no processo eleitoral, que privilegia uns partidos em detrimento de outros na distribuição do tempo no horário eleitoral gratuito. Em entrevista ao Sistema O DIA, Zé Maria teceu duras críticas aos adversários e ao modelo de governabilidade adotado pelo PT.


Por Elizângela Carvalho, Wanessa Mendonça, Mayara Martins e Perpétua Alencar


Candidato, essa não é a primeira vez que o senhor disputa a Presidência da República. Por que o senhor resolveu lançar novamente o seu nome e o que mudou desde a sua primeira eleição para presidente?

Essa decisão se deve ao entendimento do PSTU de que é necessário termos uma alternativa socialista, que defenda dentro da sociedade brasileira os direitos dos trabalhadores, uma outra forma de

organizar a sociedade e o País. A nossa leitura é de que a candidatura do PSDB, o Serra; do PT, a Dilma, e do PV, a Marina, defende a mesma coisa, o mesmo modelo econômico, que beneficia os bancos, as empresas, o agronegócio. Enquanto isso, se agravam os programas sociais de maior parte dos brasileiros. São mudanças na estrutura econômica do País para assegurar uma vida digna aos brasileiros

e o PSTU acredita que seria preciso fazer essa defesa no processo eleitoral.


A principal proposta do seu partido é o combate ou a redução das desigualdades. Isso não é possível através do capitalismo? Só do socialismo?

Na verdade, a concentração da riqueza produzida na sociedade é característica principal da sociedade capitalista. Se há uma verdade na propaganda feita pelo Governo é que o Brasil cresceu muito nos últimos anos. Para onde foi essa riqueza? Para dono de banco, de fábricas, do agronegócio. Para o povo, as coisas

estão cada vez mais difíceis, não é aquela coisa bonita que aparece na televisão. O IBGE informou, na última pesquisa de orçamento familiar, que um terço da população - 68 milhões de pessoas - passa

fome, 65% das famílias não conseguem fazer o salário render até o final do mês. Temos 40 milhões de crianças que morrem de fome a cadaano no Brasil. Não é porque o Brasil não tenha recursos para

assegurar alimentos para salvar a vida dessas crianças, é porque os recursos são destinados a garantir a riqueza do banqueiro em Nova York, para aumentar o lucro das grandes indústrias no País. Defendemos

a mudança para que a riqueza que o Brasil tem, que é muito grande - minérios, petróleo, terras, biodiversidade e a riqueza produzidas por milhões que compõem a classe trabalhadora - tem de ficar com o povo, para garantir emprego, para melhorar o salário, a aposentadoria, garantir educação e saúde pública de qualidade para todos, tudo aquilo que o povo precisa para ter uma vida digna. Se redirecionamos nossas riquezas, o brasileiro pode ter uma vida digna.


O senhor foi um dos fundadores do PT. O que levou o senhor a se desvincular do partido?

O PT mudou. Ele surgiu e cresceu e a própria liderança do Lula foi catapultada a ser o que é hoje pelo sonho que a classe trabalhadora brasileira acalentou no meio a década de 70, início da década de 80, em

meio àquelas greves que ocorreram no País naquele momento, de que nós, que somos trabalhadores, a maioria da população, é que possuímos a riqueza da nação, que fazemos o País funcionar. Por que não podemos ser Governo? O problema é que no meio do caminho o PT e o Lula resolveram fazer uma

aliança com os banqueiros e grandes empresários para chegar ao Governo e fazer o que estão fazendo, mantendo os privilégios dos grandes empresários em detrimento da classe trabalhadora. Quando

esse processo ficou evidente, no final da década de 80, início da década de 90, nos afastamos do PT e fundamentos no PSTU, em 1994. Justamente para resgatar esse sonho de que a classe operária pode,

sim, governar o País, e governar contra os banqueiros e os grandes empresários, mudando a estrutura econômica do País, de forma que paremos de trabalhar para enriquecer banqueiro, mas para assegurar condições dignas de vida para nós e a nossa família.




O candidato José Serra deu declarações a favor da redução do espaço para os nanicos. Como o senhor vê isso?

O José Serra deve estar com saudade da ditadura. O regime político que restringe existência de partido político é a ditadura. Obviamente, o povo brasileiro não tem saudade de um regime de exceção dessa magnitude. Não há democracia sem plena liberdade de organização partidária. José Serra está na contramão da história. De mais a mais, os pequenos partidos já são prejudicados e muito nesse processo

eleitoral, que escasseia a democracia nesse processo, que permite ao José Serra recolher os R$ 120 milhões que ele diz que vai recolher junto a bancos, empreiteiras e grandes empresas e depois, se

ganhar a eleição, obviamente vai trabalhar para esses grupos que financiaram a candidatura dele. É assim que é financiada também a candidatura do PT e isso interfere no resultado das eleições. Mas, o mais grave

é justamente o tempo na TV. O horário eleitoral gratuito, que é distribuído por lei, foi votado pelos deputados de forma a privilegiar os deputados em detrimento do restante da população. Então, a Dilma tem 10 minutos, o Serra tem 7 minutos e eu tenho 50 segundos. Que democracia há nisso? Para agravar ainda mais, as grandes redes de comunicação do País, que são privadas, se deram ao luxo de fazer campanha para três candidatos. Não apresentam as demais candidaturas no debate, nas entrevistas, no noticiário, o que priva a população de conhecer cada candidato, o que pensa cada candidato. Vamos ter uma parte

grande da população que vai votar achando que só há três candidatos a presidente da República. Isso, obviamente, manipula o resultado das eleições. O maior problema do Brasil não é tirar o espaço dos

pequenos partidos, é assegurar um espaço igualitário. Se são nove candidatos, porque não temos o mesmo tempo na TV para cada um deles durante o dia, para que de forma equitativa pudessem defender suas idéias e a população, conhecendo as idéias de cada um, escolher? Não tenho pretensão

de achar que as pessoas, conhecendo o PSTU, vão todas concordar conosco. O que não posso permitir é que as pessoas sejam privadas de saber o que eu penso. Falta, no processo eleitoral, não é controle,

falta democracia, falta espaço para os pequenos partidos, especialmente os que têm projeto para o País, como é o caso do PSTU. É preciso restringir o clientelismo e o mercantilismo no processo eleitoral. O PDMB na campanha para o PSDB, nesta eleição está alugando para o PT. O PP e o DEM vivem alugando o tempo deles para o PSDB. Assim que funciona. Esses são os problemas do sistema eleitoral brasileiro, o

financiamento privado, ausência de debate público. PV, PSDB E PT reiteradamente dizem que a prioridade

absoluta é educação, é saúde, só que o PSDB e o PT já governam o País há 20 anos, então por que a educação pública está o caos que está, a saúde pública sucateada como está? Por que esses partidos

não têm compromisso com o que falam na TV, não devem satisfação a ninguém, porque não há o contraditório, eu não posso estar na TV questionando isso em um debate. Dessa forma, vão tentando

engabelar o povo e se perpetuar no poder.


O senhor falou em sonho. É esse sonho que move o PSTU, é um sonho socialista?

Sem dúvida. A razão de ser do nosso partido é perseguir o sonho que buscamos desde sempre, uma situação melhor de vida para a classe trabalhadora. É da natureza do capitalismo concentrar riqueza para

os grandes empresários, a burguesia. Achamos que há outra forma de organizar a sociedade, o País, com a nacionalização de terras com o objetivo de produzir alimentos para o povo brasileiro, estatizar ou

reestatizar todas as grandes empresas do País para que as riquezas fiquem com os trabalhadores, estatizar os bancos e o sistema financeiro para que esses recursos sejam usados para construir escolas e hospitais e parar o pagamento da dívida externa e interna, que já foram pagos dezenas de vezes. Uma sociedade socialista, igualitária, para que todos tenham acesso a condições materiais para ter uma vida

digna; uma sociedade governada em um regime democrático, onde a juventude, os trabalhadores com suas organizações governem o País, onde os partidos políticos tenham liberdade de organização e

discutam suas idéias no interior de suas organizações e, dessa forma, tentem convencer a população de suas ideais, mas isso cabe aos trabalhadores decidir, soberanamente, o destino do nosso país. É difícil, é? Mas não temos o direito de fazer apenas aquilo que é fácil, mas o que é necessário.




O PSTU é um partido de trabalhares. Por outro lado, o partido não recebe retorno nas urnas, tendo seu discurso muitas vezes tachado de radical. A que o senhor atribui essa rejeição?

Não é rejeição, é desconhecimento. Ampla maioria da população brasileira não vai sequer ter conhecimento das propostas do PSTU, porque não é dada a oportunidade de divulgar nossas propostas.

Em um país com dimensões continentais como é o Brasil, não há outra forma de chegar à população a não

ser através da TV. Não há outra forma de a população conhecer os candidatos e suas propostas a não ser a TV. Segundo uma pesquisa da Folha de São Paulo, 88% da população irá definir seu voto através da TV. Quando somos excluídos da TV, somos excluídos do processo, mas essa não é a única razão. Nosso povo é muito generoso. O povo vê o que o Lula está fazendo, esse muito pouco frente a esse grande crescimento econômico que o País está vivendo e acha que, como está, é melhor que antes, é melhor manter como está. Mas, na verdade, a comparação que o povo deveria fazer era entre aquilo que precisamos para ter uma vida digna e o que o País está dando. É esse debate que queremos levar aos trabalhadores do País. É verdade que o Lula aumentou em 57% o saláriomínimo dos trabalhadores, mas o que ele não diz é que o lucro dos bancos aumentou 500%. É verdade que o Bolsa Família ajuda 12 milhões de famílias a viver melhor. Mas é uma vida digna, R$ 70, R$ 120 para uma família? O Lula gasta R$ 130 com aquele charuto que ele gosta de fumar. Se pegarmos o orçamento do ano passado, vamos ver a verdadeira prioridade do governo dele. O Bolsa Família, que é a menina dos olhos do Governo, gastou R$ 11 bilhões. O Bolsa Banqueiro foi de R$ 380 bilhões. A prioridade são os banqueiros. Se tivessem investido esses R$ 380 bilhões para melhorar a vida das famílias mais pobres, era possível gerar emprego, garantir vidas dignas, moradia, saúde, educação, é disso que essas famílias precisam.


O senhor é contra políticas emergenciais como o Bolsa Família?

O Bolsa Família só faz sentido para ajudar a quem está passando fome, não pode ser um programa estrutural de governo. Nestas eleições, estão o Serra, a Dilma e a Marina disputando para ver quem vai

ampliar mais o Bolsa Família. Isso é uma temeridade. O povo brasileiro precisa é de emprego. Deveriam estar preocupados em tirar dinheiro dos bancos para investir e gerar emprego, salário signo para essas pessoas. O que o governo socialista vai fazer é prover essas pessoas de emprego, aposentadoria, moradia digna, porque o Brasil tem recursos para isso, se parar de canalizar esses recursos para o dono do agronegócio, do banco, da indústria.


O senhor disse, em entrevista recente, que o problema do sistema socialista de Cuba não é resultado do socialismo em si, mas do modelo político implantado lá, com um só partido. No caso do Brasil, como seria um modelo socialista que não incorresse nesse erro e como haveria uma alternância de poder, já que poucos são os partidos socialistas?

O socialismo pressupõe liberdade, democracia, não há socialismo em um regime de partido único, uma ditadura, como é Cuba desde a Revolução de 1959. Defendemos um regime de plena liberdade de organização partidária e sindical. Os trabalhadores vão, através das suas organizações, governar o País. Acredito que em uma sociedade organizada e dirigida pelos trabalhadores surgirão inúmeras organizações políticas expressando suas opiniões. Achamos possível e necessário assegurar um ambiente de liberdade. Só nesse ambiente, o povo pode debater e discutir e definir de maneira soberana. No capitalismo, isso é impossível, todas as organizações só podem decidir tendo em vista o interesse do banco. O que houve em Cuba foi um erro grosseiro do Partido Comunista Cubano, que, ao burocratizar, constituiu uma ditadura... os interesses desses burocratas acabaram destruindo a boa parte das vitórias do povo. Há muita coisa que se diz que é: como se errou em Cuba, na União Soviética, não adianta tentar. O que não tem jeito é o povo não viver dignamente. Acho que é possível aprender com os erros do passado. Se trabalharmos com afinco, podemos construir uma sociedade muito melhor que essa sociedade que vivemos hoje. Aliás, o que seria da humanidade se não fosse essa capacidade de sonhar com um mundo melhor e de buscar esses sonhos? Imagine, se 200 anos atrás alguém tivesse dito que mandaríamos alguém para a Lua, ninguém iria acreditar. Mas, o ser humano foi capaz de fazer isso. É capaz também de construir uma sociedade justa e igualitária.


O PSTU tem de R$ 250 mil a R$ 300 mil para fazer sua campanha. Esse é o maior entrave que o partido enfrenta?

Sem dúvida nenhuma. Recentemente, o TSE se dedicou a perder tempo para permitir que os humoristas

façam humor com os candidatos. Mas, o Tribunal não vê nenhum problema em um candidato arrecadar R$ 200 milhões com empresários, com banqueiros. Por acaso, os ministro do TSE acham que um banco dá R$ 130 milhões para um candidato de graça, que depois não vem retorno? Essa forma de financiamento

é absurda, isso é a base da corrupção na política do Brasil. Depois, esses candidatos vão governar para essa grandes empresas. Tenho R$ 250 mil, R$ 300 mil para percorrer uma parte do País de forma

bastante precária. Vou atingir uma parcela bastante pequena do Pais. Sequer dinheiro para fazer boletim do partido nós temos. A atividade do partido tem como base a nossa militância. Deveria ser proibido o

financiamento privado de campanha. Nós não aceitamos dinheiro de empresas. Nosso compromisso é com trabalhadores. O financiamento privado deforma o processo eleitoral, gera desigualdade de condições para disputa. O Estado deveria garantir um financiamento pequeno – o Brasil tem outras prioridades para gastar dinheiro, não é com campanha eleitoral. Com R$ 500 mil, qualquer candidato faria campanha, se nós tivéssemos três, quatro minutos por dia na TV.


Em relação ao Piauí, há algum tipo de projeto ou proposta direcionada?

Essas propostas que temos para o país, obviamente, repercutem também no Piauí, no Nordeste. Propomos uma mudança na estrutura da economia, no sentido de que a riqueza produzida ficasse aqui

no Piauí, ficasse com os trabalhadores. Mas há questõesparticulares, no sentido de tentar desenvolver, ao contrário dessa ocupação do território do Piauí pelo agronegócio, as terras que o Piauí tem próprias para produzir alimentos para os trabalhadores que querem trabalhar com a terra com apoio do Estado. E, não apenas do ponto de vista do financiamento, do preço mínimo, mas da orientação técnica e tecnológica,

para que se possa produzir aqui aqueles alimentos que são adequados à região, ao solo. A descentralização da riqueza do País pressupõe também a descentralização da capacidade de produção industrial, desenvolvendo ainda mais a indústria nessa região, seja de alimentos, de bens de consumo, que pode gerar uma produção maior de riqueza noPiauí, que fique com a sociedade do Piauí e ajude nessa diminuição da pobreza.

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